David Negro e o Condestável

Estátua equestre de D. Nuno Alvares Pereira, junto ao Mosteiro da Batalha. https://commons.wikimedia.org/wiki/Category:Left_side_views_of_the_Est%C3%A1tua_Equestre_de_D._Nuno_%C3%81lvares_Pereira

Nuno Álvares Pereira, Santo Condestável, figura incontornável da História de Portugal, formou uma das maiores fortunas do reino nas últimas décadas do século XIV. Uma parte dessa fortuna foi herdada do seu pai, o qual foi prior da Ordem do Hospital, desde 1341. Outra parte, bastante significativa, foi doada pelo rei D. João I, ainda quando era apenas Mestre de Avis. Uma das mais relevantes dessas doações, consistiu nas propriedades que pertenciam a David Negro, o qual tinha sido privado e almoxarife de D. Fernando. É esta última doação que iremos aqui observar.

Sabemos que os Negro eram uma das famílias judaicas mais poderosas e com uma longíssima presença na corte portuguesa. Além disso, está documentalmente confirmado que alguns membros desta família de judeus, conhecida pelo seu nome árabe Ibn Yahia, foram de facto arrabis-mores de Portugal nos reinados de D. Dinis e de D. Afonso IV, e posteriormente nos reinados de D. Duarte e D. Afonso V. As fontes hebraicas afirmam que esta ligação com a corte e a sua relevância como a mais distinta e poderosa do reino ocorria desde o tempo de D. Afonso Henriques, uma informação que carece ainda de confirmação por outras fontes.

O nome de David Negro caiu em desgraça em Portugal, por traição ao reino, enquanto em Castela, D. Juan I o nomeava Rab de la Corte, ou seja, atribui-lhe o mais alto cargo oficial concedido a um judeu, onde este desempenhou funções da maior relevância no processo de coleta fiscal do reino castelhano.

Os bens que foram doados pelo Mestre de Avis, a seis de Março de 1384, consistiam em várias propriedades urbanas e rurais situadas em Lisboa e em torno desta cidade, nomeadamente casas na judiaria grande, e em outros locais, uma quinta em Camarate, rendas de aforamentos em Sacavém, Catujal, Unhos, Apelação, Frielas e Póvoa de Santo Adrião, e ainda, uma vasta propriedade rural no termo de Almada, nomeadamente, uma propriedade constituída por salinas na Ponta dos Corvos, perto do Seixal, uma grande quinta em Corroios e o Pinhal das Covas de Prata.

Grande parte deste imenso património acabaria doado pelo Condestável aos carmelitas do Mosteiro do Carmo, mas uma parte destas propriedades acabariam por voltar à família judaica dos Negro, pois D. Cinfa, mulher de David Negro, terá apresentado uma contenda, onde tentava reahaver a sua parte e dos seus dois filhos, Gadelha Negro e Judas Negro, dos bens que tinham pertencido ao judeu cortesão. Segundo a documentação do arquivo dos carmelitas, D. Cinfa terá mesmo conseguido recuperar uma parte desses bens, o que demonstra como esta família tinha uma relevante posição social e uma influência notável nos meandros da corte e da justiça do reino português.

Manuel Fialho Silva

Bibliografia:


Rey de Portugall e do Algarve, Senhor de Çepta. Livros I e II de D. João I (1384-1433). Documentos do Arquivo Municipal de Lisboa, nº 1, Câmara Municipal de Lisboa/Direção Municipal de Cultura, Divisão de Gestão de Arquivos, Lisboa, 2010, doc. 86-a, pp. 168-169.


SANTANA, José Pereira de, Chronica dos Carmelitas da Antiga, e Regular Observancia nestes Reynos de Portugal, Algarves e seus Dominios... Officina dos Herdeiros de Antonio Pedrozo Galram, Lisboa, 1745, pp. 381-382.

 

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