Lisboa 1524

Luís de Camões quinhentos anos depois do seu nascimento

Retrato de Luís de Camões por Fernando Gomes (1570). Torre do Tombo

A vida de Luís Vaz de Camões, conhecido mais simplesmente por Luís de Camões, tem estado envolvida em muitas controvérsias que aqui vamos ultrapassar de forma a apresentar com a concisão e clareza possível as informações essenciais e seguras que permitem referenciar os tópicos do conhecimento da vida de um “homem feito de carne e de sentidos”, como ele dizia, e que foi um daqueles “que por obras valerosas se vão da lei da morte libertando“.

Camões nasceu em 1524, em Lisboa, segundo o declarou Manuel Correia, que o conheceu. Ele era filho de Simão Vaz de Camões e de Ana de Sá, sendo aparentado com a família de Vasco da Gama, que viria a cantar em Os Lusíadas, pois a sua avó paterna era D. Guiomar da Gama, que casou com Antão Vaz de Camões, sendo estes os pais de Simão Vaz de Camões.

Há que assinalar o facto de Camões ter estado relacionado com numerosas famílias da nobreza portuguesa.

Durante alguns anos da sua juventude Camões esteve em Coimbra, mas foi em Lisboa que viveu grande parte do tempo e se formou culturalmente enquanto frequentava a corte. Para lá da vivência boémia e amorosa de Camões sabemos que ele se deslocou a Ceuta como militar, aí tendo perdido a vista direita.

Depois desta tragédia Camões regressou à capital portuguesa, onde em 15 de junho de 1552 foi preso na cadeia do Tronco, depois de ter participado numa rixa na rua das Portas de Santo Antão, durante a qual feriu Gonçalo Borges.

Em 23 de fevereiro de 1553, Camões foi perdoado por D. João III e pouco tempo depois embarcou para a Índia na nau São Bento, a qual deixou Lisboa em 24 de março de 1553, tendo chegado a Goa no início de setembro deste mesmo ano.

Logo em novembro de 1553 Camões participou numa expedição militar dirigida pelo vice-rei D. Afonso de Noronha ao Malabar (sul da Índia).

Depois dessa ação Camões foi numa armada portuguesa até à entrada do mar Vermelho e a Ormuz.

Tal como acontecera em Lisboa Camões continuou a ter no Oriente uma vida com problemas e dificuldades de vária ordem. O ponto mais relevante da sua biografia durante os anos em que aí viveu consistiu numa ida à China, onde, segundo Diogo do Couto, foi como “provedor dos defuntos”. A memória da ida de Camões a Macau ficou testemunhada no topónimo “penedos de Camões” e aí existiu.

Vindo da China, rumo a Malaca, Camões naufragou perto da foz do rio Mekong, sendo sido famosa a sua intervenção para salvar Os Lusíadas, que estava a escrever, facto que ele próprio referiu nesta obra.

De entre as atividades de Camões em Goa assinalou-se a redação de uma ode ao Conde de Redondo que serviu de apresentação à obra de Garcia de Orta, Colóquios dos simples e das drogas (…), que aí foi publicada em 1563, tendo sido a sua primeira obra impressa.

Camões deixou Goa nos finais de 1567 para ficar retido na ilha de Moçambique por não ter pago uma dívida de 200 cruzados que contraíra junto de Pero Barreto, que até aí o levara. Camões aproveitou essa pausa forçada na sua vida para acabar de rever Os Lusíadas, que tencionava publicar quando chegasse a Lisboa.

Foi graças à intervenção de Diogo de Couto e de outros amigos de Camões que ao terem chegado a Moçambique em 1569 aí lhe pagaram a referida dívida, permitindo assim o seu regresso a Lisboa, o qual ocorreu em 7 de abril de 1570.

Tinham então passado dezassete anos desde que Camões partira para a Índia e começara a preparar Os Lusíadas, obra que estava então pronta para a impressão. Esta foi autorizada por um alvará régio de 23 de setembro de 1571, tendo a aprovação da Inquisição sido passada pelo dominicano Bartolomeu Ferreira.

O livro acabou por sair dos prelos do tipógrafo lisboeta António Gonçalves talvez em 12 de março de 1572, pois é esta a data que foi assinalada para Camões começar a receber uma tença anual de 15 000 reais. No documento que nesse sentido lhe foi passado em 28 de julho de 1572 por D. Sebastião declara-se que ela lhe foi concedida: “Havendo respeito ao serviço que Luís de Camões, cavaleiro fidalgo de minha casa, me tem feito nas partes da Índia por muitos anos (…) e à informação que tenho do seu engenho e habilidade e à suficiência que mostrou no livro que fez das coisas da Índia”.

Em 1576, Camões publicou uma elegia e um soneto que serviram de apresentação do livro de Pêro de Magalhães de Gândavo, História da província Santa Cruz, que neste ano foi impresso em Lisboa.

Camões adoeceu e morreu em 10 de Junho de 1580, provavelmente no Hospital de Todos os Santos em Lisboa. Tinha 56 anos, menos 2 do que Vasco da Gama quando morreu em 1524.

Pouco antes da sua morte Camões escreveu uma carta ao seu amigo D. Francisco de Almeida, que em 1580 era capitão-geral da comarca de Lamego, na qual declarava, de uma forma amargurada e simbólica:

Enfim, acabarei a vida; e aqui verão todos que tão amante fui da minha pátria, que não contente de morrer nela, quis também morrer com ela.

Em 25 de agosto de 1580 D. António perdeu a batalha de Alcântara e tal derrota permitiu que Filipe II de Castela fosse aclamado rei de Portugal no ano seguinte.

Diogo do Couto registou que “o enterrou a companhia dos cortesãos e o depositaram à porta do mosteiro de Santana, da banda de fora, chamente”.

Camões terá vivido os últimos anos de vida com a sua mãe perto desse mosteiro numa casa que, segundo Vieira da Silva e Matos Sequeira se poderá ter situado ”no recanto superior que forma a Calçada Nova do Colégio, onde ela faz a volta para a calçada de Santa Ana”.

Como era Luís de Camões?
Conhecemos a imagem de Luís de Camões porque ele foi retratado em 1570 pelo pintor Fernando Gomes tendo em vista a preparação de uma gravura que deveria acompanhar a primeira edição de Os Lusíadas, que nesse ano começou a ser preparada. Tal gravura acabou por não ser feita e o original desse retrato perdeu-se, mas dele foi feita uma cópia no início do século XIX, a qual nos permite conhecer as suas feições enquanto estava vivo.

Lembranças finais:
Nesta breve evocação de Luís de Camões temos por bem concluí-la com duas das suas reflexões caracterizadas pela profundidade e atualidade relativamente à vida e à História, que continuam a ser de ponderar. Numa delas lemos num soneto:

Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades,
Muda-se o ser, muda-se a confiança:
Todo o mundo é composto de mudança,
Tomando sempre novas qualidades.

Na outra reflexão, que pelo seu valor e simplicidade deve ser de leitura obrigatória, ele explicou a evidência profunda que se pode ler na sua elegia 1:

Não meças o passado com o presente.

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