Lingerie, Roupa Interior e Meias na Baixa e no Chiado

Para “vestir” a nossa intimidade a Baixa e o Chiado dispõem de mais de uma vintena de casas, onde a predominância é claramente pertença da Baixa, com mais de 2/3 das lojas. Destaque para aquela que é a principal artéria - rua Augusta - e que concentra 4 das 14 lojas da Baixa. Mas as firmas Brava e Zínia,  com 2 estabelecimentos cada, a Ardézia Lingerie e a marca francesa DIM também escolheram  implantar-se na Baixa.  Quanto às restantes 7, também se torna nítido outro micro cluster, identificado na rua do Carmo, sobretudo a metade da rua que é contígua aos Armazéns do Chiado, numa das artérias que acaba por fazer a transição da Baixa para o Chiado. Quanto ao Chiado propriamente dito, não passa despercebido aquele que à primeira vista poderíamos considerar como o “casal” - Rei das Meias e Rainha das Malhas - do Largo Rafael Bordalo Pinheiro; mas a eventual cumplicidade, a surgir da possível complementaridade no negócio, não nos permite ir além daquela a que nos habituámos a designar por “relação de vizinhança”. Justificação na própria origem da palavra “vizinho”, do latim vicinus: o que mora próximo. Relação vicinal, no sentido da proximidade das lojas, mas também próxima no que toca à complementaridade de um grupo comercial composto pela Calzedonia / Intimissimi / Tezenis. É justamente esta a ordem de nascimento do grupo que tem em Itália a sua naturalidade e que chegou a Portugal na década de 90 do século passado, e que pouco a pouco tem-nos vindo a conquistar. À primeira fica mais fácil reconhecermos a proveniência do nome, pois basta recordar que “calze” significa meias em português, já à segunda é mais difícil, não só porque remete para a palavra intimidade, como pelo facto da modelo russa que deu corpo à campanha ser namorada de Cristiano Ronaldo, o futebolista internacional português "Bol(t)a de Ouro". Apesar de serem marcas distintas, cada qual com o seu target, têm uma visão de conjunto que pretende dar resposta e preencher aquelas que são as necessidades de “roupa íntima” de um público feminino e masculino e que cada vez mais tem vindo a ganhar espaço, também, no domínio dito “exterior”. Neste contexto, a localização de qualquer Calzedonia faz com que tenhamos uma Intimissimi a meia dúzia de passos, ou vice-versa. Isto para dizer que o grupo acaba por se evidenciar, com 7 das 21 lojas; lojas essas que paulatinamente têm vindo a dar outra cor ao comércio desta área da cidade. Ao todo são "posto de trabalho"  para mais de 70 pessoas, e se numas está apenas o dono, noutras podemos ter equipas de 5, o que faz com que  tenhamos em média 3,5 pessoas por loja. Através da decoração e de um atendimento profissional e habilitado estas lojas fazem um exercício quase de trapezista:  tentando equilibrar a relação de um artigo que é por natureza íntimo, mas que tem que se dar à exposição para ser vendido. Excepção para a Dama de Copas que recupera precisamente este lado mais intimista e que declina a presença no espaço público. 

Lingerie, uma moda sempre em mudança

No que toca ao vector intangível, muito há a dizer de um sector que sabiamente parece saber tirar proveito do “espírito do tempo”, afinal muita coisa já mudou desde que Paul Poiret libertou a mulher daquele que foi o protagonista da época vitoriana - o espartilho. A França, na Belle Époque, operou uma mudança de paradigma que se traduziu também na nova forma de vestir, trazendo à rua efervescência, liberdade e fluidez nos movimentos, ostentação e sensualidade. A deslocação da vida social para os cabarets fez nascer novos contornos na arena cultural, o can-can ganhou vida, referimo-nos à dança; porque a Cancan do Rossio surgiu em 1962, assumindo-se como «a primeira loja de lingerie da capital». Inauguração que a acontecer em França ou em Inglaterra certamente não suscitaria quaisquer dúvidas, mas que à luz de um país que vivia sob o jugo ditatorial, em que a mulher ficava à mercê da «boa vontade» do «patrão do lar» - conforme estabelecia a Constituição - constituiu uma aposta arriscada, que se veio a revelar certeira, conforme declarou Lina Antunes.

Acaba por ser interessante através do que à primeira vista parece não passar de peúgas, cuecas, ou soutiens poder perscrutar-se usos e costumes, estilos de vida…, em suma, descortinar-se a evolução social e a História do Pensamento. Optámos por encetar dirigindo o olhar para um dos ângulos que se revelou recorrente neste périplo pela roupa interior, meias e lingerie: a cor e o seu simbolismo. Pois bem, o branco e a simplicidade persistem, a lembrar reminiscências ainda do séc. XVII, onde à alvura correspondia a pureza, mas também há lugar para as rendas e para os folhos como que a resgatar o estilo barroco do séc. XVIII. Embora se reconheça a forma como a paleta de cores tem vindo a alargar, já que ao branco, preto e cor de pele (apontadas, ainda, como as cores “rainhas” do sector) somaram-se os vermelhos, os verdes, os amarelos, os azuis, os florais, os laranja, ou os lilases, muito a traduzir a liberdade que a mulher foi conquistando na esfera pública. Afinal, e conforme foi dito pela maioria destas profissionais «cada vez mais o «interior» é uma extensão do «exterior», e tanto a mulher como o homem têm um cuidado acrescido com esta «segunda pele», tentando conciliar o conforto com o design.» Este padrão não tem deixado o mercado indiferente e as marcas têm procurado dar resposta a essa procura múltipla que é enformada por estilos de vida cada vez mais diferenciados. A matéria prima que dá forma a estes artigos também já não se esgota no algodão ou na seda, a lycra, o polyester, ou o modal têm vindo a ganhar terreno e a preocupação com o bem-estar tem vindo a ser um imperativo, daí que muitas peças já recebam um tratamento hidrófilo para facilitar a evaporação da transpiração. Outra novidade, eventualmente a contrariar o glamour que os arrendados impõem ao campo da sedução, são os conjuntos que procuram fazer a continuação da própria pele, onde a tónica é a discrição, a ausência de costuras, a simplicidade pura. Quanto a sentidos, interpretações, tanto podemos intuir que significa o terminar de um ciclo de independência que a mulher teve que conquistar "a pulso”, como podemos dizer que a mulher está mais centrada em si, dando mais ênfase ao “conforto” do que à “sedução”, conforme revelaram alguns destes profissionais. Não se pode prosseguir sem falar daquele que foi apontado como o principal segredo da profissão, o saber ajustar as “copas” aos seios de cada mulher, que por sua vez diferem em tamanho e forma, ora este mundo das “copas” quase que percorre o alfabeto inteiro, sendo que a maioria das marcas inicia a escalada com a copa “A” ou “A+”, já o fim recolhe menos unanimidade (podendo terminar na “D” ou ir por aí fora), ficou também o esclarecimento que «a copa correcta deve ser a que comporta o seio ajustadamente, sem sobrar nem faltar!».  

Mas a oferta no cômputo geral, extensa e variada, tem capacidade para ir ao encontro de quem procura o mais tradicional, ou o mais arrojado, com lugar para as cintas adelgaçantes, as leggings, as collants, os fatos de banho ou os triquinis, os pijamas ou os roupões, os acessórios, etc., etc. Pelo que se percebe que estas lojas estão aptas não só a responder às diversas exigências, como à concretização de um sonho ou de um fetiche até, numa procura constante de se ajustar aos diversos ciclos de vida. Estas profissionais revelaram-se também atentas a outro fenómeno que situaram já mais no desenlace da segunda metade do primeiro decénio do séc. XXI, ou seja, o alargar da idade da procura pela lingerie e roupa íntima. Explicação que segundo elas é sobretudo decorrente de «as jovens que nos procuram serem cada vez mais jovens e as velhas serem cada vez mais velhas», certamente a traduzir a antecipação da idade da puberdade e o aumento da esperança média de vida.   

Roupa interior para homens

E se é verdade que a atenção ainda está mais voltada para o segmento feminino, também não deixa de ser verdade que o segmento masculino tem vindo gradualmente a conquistar terreno. E se nuns caso, que é como quem diz lojas, a relação se fica pelos 85% - 15%, sendo o artigo masculino apenas um complemento, noutros a relação, ainda que não equitativa, já  se aproxima bastante mais. Também no que toca aos hábitos de compra masculinos, foi assentido pelo sector que o homem é cada vez mais o responsável pela compra da sua própria roupa íntima, e fâ-lo assertivamente. Tal como é tendencialmente fã de determinada marca e determinado modelo, o que não quer dizer que não esteja receptivo à novidade, prova disso é o aumento da procura pelo segmento “moda”, a extravasar os azuis escuros ou os cinzentos que quase encerravam as cores de roupa interior masculina.   

Judite Lourenço Reis

 

Levantamento das lojas de lingerie, roupa interior e meias da Baixa e do Chiado (descarregar PDF)

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