Casas de Aprestos Marítimos e Equipamentos de Navegação da Baixa e do Chiado

Este é o ramo de actividade que aprovisiona os navios em tudo o que são cabos, correntes, poliame, velas, redes, guinchos, maquinas de içar cargas, em suma os aprestos marítimos ou navais. Este é o comércio especializado nos meios para as tracções, cargas e descargas, atracações e amarragens. Apresto: conjunto de tudo o que é necessário às múltiplas actividades a bordo, que este ramo fornece, tudo excepto motores, viveres, roupas e medicamentos.

Por coincidência das 4 firmas existentes, 3 foram fundadas em 1941 mas eram muitas mais aqui na zona do Cais do Sodré, Boavista e Conde Barão: uma dúzia no final do século XX. Foram muitas delas criadas por oficiais da Marinha, mercante ou de guerra, antes de passarem a outros proprietários, alguns vindos da própria industria de cabos, fornecedores destes comércios. Estes comércios são mais armazéns, e de fabrico hoje nada fazem, excepto algum pequeno arranjo, preparação de cabos pequenos e médios, corte de telas e lonas.

Os materiais também foram mudando: do sisal, cairo, algodão, vieram as fibras sintéticas, o nylon, o PVC e muitas outras que combinadas dão interessantes resultados em resistência, leveza e flexibilidade. Mas desde os anos 80 que os cabos de aço vieram a tomar forte posição. Outros equipamentos surgiram: as cintas, os aparelhos de içar, etc.. Outros materiais e equipamentos tendem a desaparecer: as lonas para velas também já são poucas - para a marinha de recreio, para a Sagres ou o Crioula - e até para moinhos de vento eram aqui compradas sendo depois cortadas e cozidas, senão pelo próprio moleiro ou pescador, pelas firmas de veleiros que existiram nesta zona ribeirinha até há poucas décadas atrás.

Mas fornecer a Marinha de guerra Portuguesa ainda é um ponto de honra para algumas destas empresas, já que os aprovisionamentos às Empreza Nacional de Navegação, Empresa Insulana de Navegação, Companhia Nacional de Navegação, Companhia Colonial de Navegação, Sociedade Geral, Casa Bensaude, SOPONATA, etc. tiveram mais importância no século passado. O abastecimento de navios estrangeiros também teve expressão. O Sr. Sousa, desde 1958 a trabalhar na Sociedade de Aprestos para Navios, recorda: «Existiam mais de mil navios entre todas as marinhas e armações portuguesas. Paquetes italianos para o Brasil escalavam Lisboa, mais os gregos e norte-americanos e eram mais que muitos os que se aprovisionavam aqui e nos colegas. Até abastecemos a 8ª esquadra americana em cabos de aço. Depois haviam muitos barcos de pesca, batelões e fragatas no Tejo. As barcaças faziam transbordos de cargas de e para navios que não acostavam, como os cereais e isso foi até finais de 1980. Por exemplo, os navios russos - soviéticos na altura - não podiam acostar, tinham de ficar ao largo do rio, mas a todos fornecíamos se necessário, directamente ou através dos agentes de navegação». Memórias dum rio mais movimentado que José Saraiva da Luiz Godinho também traduz: «As barcaças usavam muitas das nossas bóias em cortiça, mas havia também as fragatas que ligavam à Margem Sul, ao Sado e iam até Alcácer do Sal, levando mercadorias e trazendo sal e arroz. E existiam os estaleiros da Parry & Son, Lisnave, a Rocha Conde d’Obidos, as docas d’Alcantara, que também fornecíamos».

No total das 4 empresas são 23 as pessoas no activo, entre empregados e patrões, estes demonstrando uma proximidade com os seus colaboradores, sob o espírito «faço o mesmo ao lado deles pois não lhes peço para fazer aquilo que eu não possa fazer!» como dirá o Sr. José Saraiva, sócio-gerente desde 1975, atitude que confere um bom ambiente de trabalho e de equipa a cada uma destas empresas.

Para além da mudança de materiais e de equipamentos, é significativa a mudança de clientes e sectores onde se aplica o que aqui é vendido: se no meio do século passado eram sobretudo para as marinhas de guerra, mercante e de pesca, hoje já não é tanto assim, mas vieram acrescentar-se grandes construções e obras publicas, desde os anos 1990, fornecendo cabos de aço inoxidável das mais diversas espessuras. De certo modo este ramo de comércio virou-se do mar para a terra, ao fornecer estádios, pavilhões, pontes e torres. Mais: passou também a fornecer equipamentos de segurança, salvamento e sinalização tanto para bordo como para edifícios em construção. Fornece por afinidade de aplicações, materiais para desportos radicais e escalada, o que torna estas empresas, todas elas armazéns de utilidades - fortes e seguras - num local de procura para muitos profissionais e amadores, lugares tipicamente ”masculinos” pela forma de arrumar, de forma pratica e sem estética mas atractivas pela total exposição e possibilidade de manuseamento. “Forte, fiável, para o máximo esforço” seria o possível mote deste específico ramo de comércio. De comércio pois que hoje nenhuma destas casa tem algum fabrico industrial associado, tendo sim uma delas sido adquirida por uma indústria sua anterior fornecedora. Mas a vocação marítima continua à vista - nas fateixas e âncoras em exposição, na designação, emblemática e origem de todas elas.

Além das 3 firmas, existe a mais notável e que se associa a este ramo pela sua vocação para fornecimentos à navegação: a J. Garraio, mais de 150 anos de actividade, desde sempre em aparelhos de precisão, cartas náuticas, em papel ou em digital. Se as outras 3 firmas são como que o porão e o convés, esta é a torre de comando e sala de mapas pela sua apresentação e tipo de fornecimentos. Mas as 4 têm em comum aprestar: aprontar, aparelhar, prover do necessário, tornar preste, pronto, o navio! São as fiáveis fornecedoras de quem vai para o mar e se avia em terra! 

 

Guilherme Pereira

Inventário das Casas de Aprestos Marítimos e de Equipamentos de Navegação da Baixa e Chiado (Descarregar PDF)

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